quarta-feira, janeiro 25, 2006

Na vida, na politeia, na chôra, na eclesia - em tudo - é urgente assumir!

Que titulo este! É mesmo, e só, para não dizer logo ao que venho e o que me vai na alma.

1- Cavaco Silva ganhou as eleições presidenciais e fê-lo por vontade do Povo! Está feito.

2-Mário Soares perdeu as eleições presidenciais e tal ocorreu por vontade do Povo!

3- Manuel Alegre ficou em segundo lugar e isso aconteceu por vontade do Povo!


E podia continuar com este tilintar até me deixar adormecer.

Entretanto, apetece-me cerzir alguns, pequenos e inconsistentes, comentários ao que aconteceu.

O Partido Socialista tinha um mau candidato e, provavelmente, daria (caso o Povo lhe tivesse entregado essa incumbência...) um menos bom Presidente da República. Só esta afirmação valerá um tratado de artigos, opiniões, reflexões e programas de televisão. Mas não me apetece ir por aqui e por aqui me quedo.

Manuel Alegre cavalgou uma mula velha para se alcandorar a uma altura desmedida e sem ética: "há mais cidadania para além dos partidos!" dizia o vate repetidas vezes, até à exaustão.

A frase parece duma luminosa originalidade, mas, logo no seu interior se desconjunta completa e desairosamente.

Por definição, os Partidos representam "partes" da cidade e dos cidadãos, não coincidem totalmente com aquela e com aqueles. Mesmo em tirania, em ditadura de partido unico tal nunca ocorreu. Mesmo nesses regimes, sempre houve cidadania para além do Partido. Sempre!

Lembram-se do projecto do PRD? Discurso moralizador da polis, anti-Partidos sistémicos, leader messiánico, encoberto, que somente deu a cara já no declinio do projecto. Mas esse D. Sebastião estava então no Palácio Cor-de-Rosa e pôde criar essa mistificação que se evanesceu em pouco mais que uma legislatura!

Talvez fosse esse o projecto de Alegre. Talvez.Ocupava a Presidência da República e então "patrocinava", qual pai da Pátria, um movimento de causas. Talvez.

A falta de ética do vate, essa advem do facto de, politicamente falando, sempre Manuel Alegre ter estado ligado a "Partidos". Nasceu, cresceu e fez-se o que é - cavalgando o Partido Comunista, a Frente de Libertação Nacional de Argel e, no dealbar do 25 de Abril, o jovem Partido Socialista (dizem que tentou negociar com A.Cunhal o seu regreso ao PC, mas as condições não agradaram ao então lider incontestado dos comunistas...). Foi membro do Governo, deputado, conselheiro de Estado, vice-presidente da Assembleia da República (sempre) pela mão paternal e autocrática do Partido Socialista.

Mas é justo que se diga que Manuel Alegre tem mais vida para além do Partido Socialista. Claro que tem e muita!

Então, ao que vem para aqui chamada a ética, ou a falta dela?

Manuel Alegre fez-se candidato presidencial contra o Partido Socialista, violando uma regra básica no funcionamento dos partidos que é o dever de solidariedade com a Direcção (de que ele faz parte) e com as decisões tomadas pelos órgãos legitimos desse mesmo Partido.

Contudo ele invocou um direito superior às leis partidárias: a Constituição da República. Muito bem. Mas fica a contradição entre o direito da cidade e as leis do Partido. Como deveria ter ele contornado tal situação? Invocando a ética à moda Socrática (esta não é piada nem trocadilho com o engenheiro) e não tripudiando sobre sentimentos nobres e estados de alma legitimos dos seus apoiantes e, sobretudo, dos seus votantes.

Dos outros candidatos não falo - porque, na realidade, não estavam a disputar a Presidência da República, mas a veicular opiniões partidárias sobre quase TUDO.

Para remate de conversa, uma conclusão que me parece mais do que óbvia: o Povo falou e, quando fala, fala sempre bem!

Eu sou daqueles que pensa que o POVO fala SEMPRE bem, mesmo quando não estou incluido no campo dos vencedores. Votei Mário Soares porque era o candidato do meu Partido e por que não me reconhecia em NENHUM dos outros candidatos.

Pronto. Arrisquei estes comentários ainda a "quente". Está dito e arriscado.

J. Albergaria

terça-feira, janeiro 17, 2006

Uma Campanha Alegre (a genuína)

A propósito do título do post de Albergaria, reproduzo este trecho da Uma Campanha Alegre.
De uma enorme actualidade

«(....) - É extraordinário! E o bom senso, não o há?
- Evita-se: porque tê-lo chama-se pedantismo e publica-lo chama-se insulto.
- Mas esse povo nunca se revolta?
- O povo às vezes tem-se revoltado por conta alheia. Por conta própria, nunca.
- Em resumo, qual é a sua opinião sobre Portugal?
- Um país geralmente corrompido, em que aqueles mesmos que sofrem não se indignam por sofrer. (...)»

Uma Campanha Alegre, LIII, Janeiro 1872

Alcino Pedrosa

Recordando Eugénio de Andrade

Eugénio de Andrade nasceu a 19 de Janeiro de 1923, em Póvoa de Atalaia, concelho de Fundão, Beira Baixa. O blog Mapril presta homenagem ao poeta.



PASSEIO ALEGRE

Chegaram tarde à minha vida
as palmeiras. Em Marraquexe vi uma
que Ulisses teria comparado
a Nausica, mas só
no jardim do Passeio Alegre
comecei a amá-las. São altas
como os marinheiros de Homero.
Diante do mar desafiam os ventos
vindos do norte e do sul,
do leste e do oeste,
para as dobrar pela cintura.
Invulneráveis — assim nuas.


Eugénio de Andrade
Rente ao Dizer (1992)
In Poesia
Porto, Fundação Eugénio de Andrade, 2000


Alcino Pedrosa

segunda-feira, janeiro 16, 2006

Isto mais parece uma campanha Alegre...

Hoje, malgrado o titulo, não vou falar de Presidenciais.

Não quero; não me apetece; não é sequer de bom augúrio fazê-lo.

Tenho assistido atónito (apalermado, embezerrado, desconsolado mesmo) a um curioso debate entre os próceres de Cunhal ( o dito e falecido, Alvaro para os amigos e camaradas que agora reivindicam a memória e as palavras que aquele poderia dizer a propósito de...se fosse vivo e...falasse.)

O Abrupto do JPP dá relevo ( e muito bem...) a quase todos os que têm escrito sobre o seu 3.º Volume da biografia não autorizada de Alvaro Cunhal.

Ainda não a li, mas já tinha "devorado" com inusitado prazer de "leitor" e deleite de pequeno actor, que fui, desses tempos revoltos (entre 1963 e 1986).

O que, verdadeiramente, me espanta é que, ainda hoje, possa ler-se prosear como o de Casanova (in-AVANTE) & Vilarigues (in- O Público) de teor inquisitorial, tenebroso e sem, cada um deles, ter medo do ridiculo.

Pode discutir-se a qualidade do trabalho do "historiador" JPP, as escolhas que faz para o enfoque da biografia de A.Cunhal, o rigor das fontes, a insuficiência de testemunhos... e outros pormaiores da monumental obra.

Não se pode, hoje, em pleno dealbar do Século XXI sugerir que JPP coordena, nesse terreno de historiador, uma Campanha anti-comunista, ou anti PCP! Digo eu.

A prosa de Casanova & Vilarigues são demasiado simplistas - para serem verdadeiras.

Elas não pretendem "discutir" a História de A. Cunhal e do PCP. Creio eu que elas visam fazer fogo de barragem, por antecipação, para o 4.º Volume de JPP que há-de sair.

E porquê?
Por uma razão que me parece óbvia.
Em vida de A. Cunhal, sairam 2 volumes. Nem uma palavra oficial foi escrita sobre eles. Cunhal morre e logo se alevantam duas vozes da nomenklatura.

Os dois primeiros volumes falavam de coisas muito distantes. Já praticamente não há, nem havia já há época, testemunhos desses tempos. Os últimos a desaparecerem foram, exactamente, Ludgero Pinto Bastos e A. Cunhal.

É já o 3.º volume que traz coisas sobre as quais ainda existem testemunhas (Dias Lourenço, Jaime Serra, Sergio Vilarigues, etc), mas já muito idosos e debilitados fisica e psicologicamente.

O 4.º volume vai intervir desde a fuga de Peniche (que sei eu das intenções do autor?!...), provavelmente, até ao 25 de Abril (?), até ao 25 de Novembro (?) até à morte de A. Cunhal...

Aqui estaremos já no terreno da "luta politica e partidária", da história contemporânea com imensos actores vivos e de boa saúde.

Como se sairá desses escolhos o "historiador" JPP? A ver vamos.

O que Casanova & Vilarigues pretendem é, desde já, diminuir o "historiador" JPP, descredibilizá-lo - para que o seu empreendimento deixe de ter o brilho que realmente tem e que, estes próceres de A. Cunhal - já têm dificuldaes em apoucar.

A história já não lhes pertence e já não controlam as almas que um dia conseguiram fazê-lo. A utopia deles é já pertença da História e como tal pode ser tratada e escrita - por quem tem competência e vontade para o fazer.

Poderá ainda ter alguma eficácia para dentro do "Partido"? Talvez.

Mas quantos militantes do PCP compraram e leram os livros de JPP? E com que deleite o fizeram, aprendendo a História do "seu" Partido. Isto, Casanova & Vilarigues, não os preocupa nem interessa. O que lhes interessa é mostrar serviço ao controleiro-mor, ao "operário" (pensavam que ia falar de S. Jerónimo? Engano puro!) Domingos Abrantes, que foi proto-SG aquando do aneurisma de A. Cunhal, mas que morreu na praia da sua desmesurada ambição. Fica para a "hagiografia" militante de Casanova & Vilarigues como o "vero" SG desde que A. Cunhal "cedeu" o seu lugar a C. Carvalhas e, agora, ao simpático quanto prolixo J.S.

A história é o que é; é o que foi; e será aquilo que os historiadores forem capazes de "desenterrar" e verter em letra de forma.

O mérito de JPP é de ter sido dos primeiros a fazê-lo em relação à história do PCP, mas, como muito bem o escreveu ( e com que dignidade o fez!) tendo por companhia os nossos "manos" maprilistas António Moreira e Rogério Rodrigues.

José Albergaria

sexta-feira, janeiro 13, 2006

Ainda Bocage (a propósito das presidenciais)

Sexta feira, dia 13, "Jornal da Noite". Um apoiante de Cavaco dizia "Abram os olhos", Outro, vociferava "Nai cheira nada bem"

Lembrei-me de Bocage

Epigrama Imitado

Levando um velho avarento
Uma pedrada no olho,
Põe-se-lhe no mesmo instante
Tamanho como um repolho.

Certo, doutor, não das dúzias,
Mas sim do médico perfeito,
Dez moedas lhe pedia
Para o livrar do defeito.

"Dez moedas! (diz o avaro)
Meu sangue não desperdiço:
Dez moedas por um olho!
O outro eu dou por isso."


Nariz, nariz, nariz


"Nariz, nariz, e nariz,
Nariz, nariz, e nariz,
Nariz, que nunca se acaba;
Nariz, que se ele desaba,
Fará o mundo infeliz;
Nariz, que Newton não quis
Descrever-lhe a diagonal;
Nariz de massa infernal,
Que, se o cálculo não erra,
Posto entre o Sol e a Terra,
Faria eclipse total!"

Alcino Pedrosa

quarta-feira, janeiro 11, 2006

E QUEM ADIVINHAR....

Maprílicos amigos, Bocage este ano está "in",e os primeiros reflexos já chegaram aqui ao blogue.Assim sendo,resolvi entrar na onda do vate que nos advertiu que "é curta a idade,e as horas de prazer voam ligeiras", transcrevendo um dos seus sonetos.Para vosso recreio....e eventual proveito.



É pau,e rei dos paus,não marmeleiro,
bem que duas gamboas lhe lobrigo;
dá leite,sem ser árvore de figo,
da glande o fruto tem,sem ser sobreiro:


Verga, e não quebra, como o zambujeiro;
oco,qual sabugueiro,tem o umbigo;
brando às vezes,qual vime,está consigo;
outras vezes mais rijo que um pinheiro


À roda da raiz produz carqueja
todo o resto do tronco é calvo e nu;
nem cedro,nem pau-santo mais negreja!


Para "Carvalho" ser falta-lhe um "u";
Adivinhem agora que pau seja,
E quem adivinhar meta-o no cu.




Recordo aos mais distraídos que tempos houve na fonética portuguesa em que "u e "v",aliás como "i" e j",tinham valor semelhante.

JGEsteves

terça-feira, janeiro 10, 2006


Vale a pena ver a exposição dedicada a Bocage na Biblioteca Nacional, entre 17 de Novembro e 28 de Janeiro

E porque esta notícia por si pouco vale, enriquecemo-la com o auto-retrato do poeta


Magro, de olhos azuis, carão moreno,
Bem servido de pés, meão na altura,T
riste de facha, o mesmo de figura,
Nariz alto no meio, e não pequeno;
~

Incapaz de assistir num só terreno,
Mais propenso ao furor do que à ternura;
Bebendo em níveas mãos, por taça escura,
De zelos infernais letal veneno;

Devoto incensador de mil deidades
(Digo, de moças mil) num só momento,
E somente no altar amando os frades,


Eis Bocage em quem luz algum talento;
Saíram dele mesmo estas verdades,
Num dia em que se achou mais pachorrento.

De cerúleo gabão não bem coberto,
Passeia em Santarém chuchado moço,
Mantido às vezes de sucinto almoço,
De ceia casual, jantar incerto;

Dos esburgados peitos quase aberto,
Versos impinge por miúdo e grosso.
E do que em frase vil chamam caroço,
Se o quer, é vox clamantis in deserto.

Pede às moças ternura, e dão-lhe motes!
Que tendo um coração como estalage,
Vão nele acomodando a mil pexotes.

Sabes, leitor, quem sofre tanto ultraje,
Cercado de um tropel de franchinotes?
É o autor do soneto: é o Bocage!

Incultas produções da mocidade
Exponho a vossos olhos, ó leitores.
Vede-as com mágoa, vede-as com piedade,
Que elas buscam piedade e não louvores.

Ponderai da Fortuna a variedade
Nos meus suspiros, lágrimas e amores;
Notai dos males seus a imensidade,
A curta duração dos seus favores.

E se entre versos mil de sentimento
Encontrardes alguns, cuja aparência
Indique festival contentamento,

Crede, ó mortais, que foram com violência
Escritos pela mão do Fingimento,
Cantados pela voz da Dependência.

Chorosos versos meus desentoados,
Sem arte, sem beleza e sem brandura,
Urdidos pela mão da Desventura,
Pela baça Tristeza envenenados:

Vede a luz, não busqueis, desesperados,
No mudo esquecimento a sepultura;
Se os ditosos vos lerem sem ternura,
Ler-vos-ão com ternura os desgraçados.

Não vos inspire, ó versos, cobardia
Da sátira mordaz o furor louco,
Da maldizente voz a tirania.

Desculpa tendes, se valeis tão pouco;
Que não pode cantar com melodia
Um peito, de gemer cansado e rouco.

Alcino Pedrosa

quinta-feira, janeiro 05, 2006

Notas soltas numa melodia desafinada ou um roteiro gastronómico com alguma fome e azia à mistura

A seguir ao pequeno-almoço...

A livraria do Babilónia fechou o livro, ou melhor, as portas. E a cidade da Amadora ficou mais longe e/ou mais pobre...

A caminho do almoço...

Já repararam na quantidade de gente, em plena força da vida, que agora vai passando o seu tempo encostada a qualquer anteparo do Jardim Delfim Guimarães?

Em tempo de lanche...

Com a respectiva vénia à Bola-on-line
"Jogadores do Estoril avançam com rescisão colectiva"
"Dia negro para o Estoril-Praia, assim como para o futebol português. Todo o plantel avançou para a rescisão de contrato, o técnico Daúto Faquirá e restantes elementos da equipa técnica apresentaram a demissão, pelo que se prevê o fim do futebol profissional no histórico clube da Linha"

Mais lá para o jantar...

Depois do Salgueiros, do Farense, do Alverca, do Académico de Viseu, ou mesmo da Ovarense ou do Vitória de Setúbal, calhou agora a vez do Estoril-Praia. Como é possível um clube sedeado numa zona de jogo não conseguir manter uma equipa de futebol profissional. Nem a experiência de credenciados ex e actuais dirigentes do glorioso conseguiu dar a volta ao texto?

E aquando do chá que prepara para o descanso da noite...

Uma livraria que fecha, um jardim onde florescem cada vez mais desempregados e uma SAD que encerra a sua actividade podem e são certamente acontecimentos muito díspares. Cada um com as suas causas distintas mas todos eles reflectindo um vento que não sopra de feição.

Os sopros do futebol irão ocupar tempo e espaço dos media. Aos desempregados ninguém dará voz até que as fogueiras se comecem a acender na noite da revolta suburbana. Nas prateleiras da então livraria irá acomodar-se outro tipo de pó muito característico de certos negócios florescente de telemóveis ou outros produtos facilmente negociáveis.

Amanhã espero acordar menos observador senão ainda arranjo razões suficientes para me candidatar à Presidência da República. Estejam descansados que não é para já... Mas também não fiquem muito descansados com o que é para já.

Deixo aqui duas boas hipóteses para o cargo. Ambos com experiência de presidências de duas nações distintas. A casa do FCP do Luxemburgo pode ser considerada uma naçon?

NT - Patrocinador Oficial de 2006

quarta-feira, janeiro 04, 2006

Contributo de Sá Carneiro (não é esse,é o....)

AQUELE OUTRO



O dúbio mascarado - o mentiroso
Afinal,que passou a vida incógnito.
O Rei-lua postiço,o falso atónito -
Bem no fundo,o cobarde rigoroso.


Em vez de Pajem,bobo presunçoso.
Sua Alma de neve,asco dum vómito -
Seu ânimo,cantado como indómito,
Um lacaio invertido e pressuroso.


O sem nervos nem Ânsia - o papa-açorda,
(Seu coração talvez movido a corda...)
Apesar de.
seus berros ao Ideal.


O raimoso,o corrido,o desleal -
O balofo arrotando Império astral:
O mago sem condão - o Esfinge gorda...


MÁRIO de Sá-Carneiro escreveu em Paris,faz por estes dias noventa anos,esta notável,e creio que maprilmente oportuna,incursão pela alteridade.


JGEsteves

O Professor

Cito de memória, logo sujeito a erro

"Quem só entende de economia, de economia nada percebe"
Joseph Shumpeter
Citação a pedido de meu filho, garboso estudante de economia e anti-cavaquista assumido
Alcino Pedrosa

terça-feira, janeiro 03, 2006

O Professor

As intervenções de Cavaco Silva, na presente campanha eleitoral, deixam passar a ideia (muito em voga nos últimos tempos) de que a sociedade, cada vez mais, se circunscreve à Economia. A assunção deste princípio, se, por um lado, contradiz uma visão dinâmica da sociedade, onde interagem elementos de natureza diferente - económicos, sociais, políticos, psicológicos etc -, por outro, não deixa de ser redutor, e, sobretudo, perigoso. Isto, porque ao circuscrevermos o mundo à imagem da economia, estamos reduzir o homem a uma dimenão meramente instrumental.
Razão pela qual ao invés de uma sociedade desenvolvida, de que fala o candidato, prefiro falar de uma sociedade humanamente desenvolvida. O termo não é meu, mas de Amartya Sen, economista indiano laureado com o Prémio Nobel, e reporta-se um modelo social e produtivo em que todos os tenham igual liberdade para escolher os seus objectivos e finalidades particulares, e nessa procura enfrentem o mínimo possível de obstáculos para a realização das suas potencialidades.
Nos dias que correm, onde o desemprego, a fome e a instabilidade social são realidades recorrentes, os economistas não podem deixar de pensar nos inúmeros desajustamentos sociais provocados pelo capitalismo e a expansão da economia liberal, evitando assumir uma postura excessivamente utilitarista. Quanto mais não fosse por uma simples razão: a métrica utilitarista, medindo graus de riqueza ou taxas de crescimento, tende a distorcer a natureza das privações e a reduzir, de modo inaceitável, o domínio dos valores que moldam a vida de uma pessoa.
O candidato Cavaco, certamente, esqueceu Aristóteles, que, na sua "Ética a Nicomaco", definiu a Economia como uma reflexão sobre os constituintes do bem humano. Razão pela qual não basta dizer que a Economia deve limitar o seu âmbito de investigação ao crescimento da riqueza (sua produção, reprodução etc.), mas tem de ir mais longe, analisando os meios mais justos de promover a sua distribuição, de modo que a que os homens possam usufruir das condições indispensáveis para o seu bem-estar material e intelectual.
Se, enquanto tecnologia do saber, a economia é portadora de grandes esperanças, para que estas efectivamente se concretizem, torna-se necessário colocá-la ao serviço de um projecto global, que realize o indivíduo e npos ajude a suprir as tensões existentes entre a ordem económica estabelecvida e a ordem económica desejável.
Alcino Pedrosa

Afinal o Outro eras tu meu malandro ... e não o Outro

Afinal havia Outro que eras Tu, António. E o Outro, que eu pensava ser o Outro não era efectivamente o Outro. Complicado, não é?. Foste tu, e não o Outro, que decidiu assumir o papel de Sancho indignado, procurando ajustar contas com o terrível D. Quixote. Sem procuração do Outro, o genuíno criado, diga-se de passagem. Foste tu quem pegou nas palavras do Outro para se intrometer na polémica zoobiológica que animou este blog, nos últimos tempos. Que pensará o Outro, o verdadeiro autor do texto, desta interferência não o sabemos, tão pouco me interessa. Depois de lidos os dois posts, não foi preciso muito pensar que o Outro não podia ser outro a não ser Tu.
um abraço
Alcino

PS. Porque os blogs também são assim uma espécie de discos pedidos, mudemos a música. seja feita a Vossa Vontade

Havia um Post

Em 29 de Dezembro de 2005, uma "Farsa", que pode ser erradamente confundida como um "Auto" vicentino, foi introduzida no Blog «SR-MAPRIL», sob o título «O Super-Dragão». Por deliberação unipessoal, dada a susceptibilidade do tema abordado, foi decidida a sua erradicação, a que só alguns privilegiados tiveram acesso.

A bem da fraternidade
e em nome do fair-play

António Moreira

Mea Culpa!

Atesto a inocência do José Albergaria, agora vocacionado para altos estudos de Cultura Clássica e que também aborda com desenvoltura a hagiografia do Santo destruidor de espécies em vias de extinção. Ele, distinto zoobiólogo que conhece a diferença entre o Dragão e a Coca, está inocente!
O EU, que malevolamente reflectiu sobre eventual confusão entre o Jorge sacralizado e o outro (e outras minudências que não valerá a pena repetir), fui Eu.
Até fui eu o Anónimo, que, inpensadamente, fez descer a elevação do debate com a inserção de um viciado Auto das Barcas, pondo dessa forma em causa a tradicional comensalidade entre águias e dragões.
Fui Eu também que, disfarçado de Sancho Pança, me lancei num inusitado ajuste de contas com Dom Quixote. Coisas de escudeiro despeitado.

Daqui faço o meu Mea Culpa!

António Moreira

Como sabe bem a amizade

Que melhor prenda se pode receber - que o dom da amizade? Não conheço nenhuma que se lhe iguale!

Creio que, rememorando o divino Homero, o das páginas imorredouras da epopeia e da odisseia, esse era o dom mais perene, altivo e absoluto...na Hélade de então e, hoje ainda, se não vislumbra outro que se lhe iguale.

É um prazer dedilhar conversas, trocar chistes e mercar ironia, sem que a amizade se deixe beliscar - um pouco que seja!

Quanto ao desafio do meu bom e caro amigo (sentimos a tua falta na tertulia d'hoje, mas o ambiente estava um pedaço Preto...): claro que sim!

Vou, não só mudar de discografia, mas discorrer sobre impressões viajeiras recentes.

P'ra já vos digo: qualidade de vida? em Lisboa? Puro e rotundo engano.

Mandei-me para a Cova da Beira, no Vale do Zêzere, entre as Serras da Gardunha e da Estrela. Rumámos a Belmonte, terras dos Cripto-Judeus ou Marranos. Visitámos o Museu do Judaísmo (uma pequena pérola museográfica que aconselho, vivamente, a todos e, particularmente, a quem mexe nestas coisas de Património), o Ecomuseu do Zêzere (visitem-me este lugar e, depois, falem-me da Amadora, de Loures, de V. F. de Xira e doutras cercanias urbanas) e aportámos ao Lagar de Azeite: um deslumbrmento de requalificação de arquitectura industrial (é assim que se pode/deve chamar?...).

E que dizer do azeite Kosher e do vinho Kosher?!... Belmonte deve ter descoberto a árvore das patacas. Estes produtos estão a entrar na diáspora Judia (EUA, particularmente) e podem significar uma revitalização duma região deprimida, envelhecida e desertificada. O que é preciso, digo eu, é encontrar um ponto onde se possa alavancar o nosso "mundo" a nossa comunidade!

Estas bandas interiores (Beira Interior - se diz), bem servidas pela SCUT A23 (em duas horas e meia galga-se a distância que medeia Lisboa destes lugares), estão a apostar no Turismo de paisagem e de oferta cultural de qualidade inquestionável.

Se forem a Belmonte, não se esqueçam de visitar o Castelo altaneiro, o seu pequeno acervo arqueológico e não deixem de reparar no anfiteatro que aí construiram recentemente - que permite a realização de espectáculos de vária índole.

E a pista artificial de Ski em Manteigas?

E por que é que as várias Telvisões não enviam equipas de reportagem a estes lugares para se poder ver estas realidades e falar com as gentes que lá vivem e labutam.

Já não ia a Belmonte há dezasseis anos. Pareceu-me outra terra... e, efectivamente, o é!

Uma última nota.

Sabiam que o nosso mui querido amigo e maprilista de qualidade, Rogério Rodrigues, estudou em Belmonte?

Sabiam ainda que o grande vate e trovador, Zeca Afonso, ensinou em Belmonte e que, a Câmara local, mandou descerrar placa granítica para assinalar tal ocorrência - em frente à casa onde habitou o Professor José Afonso, bem no coração da Judiaria de Belmonte.

Um grande ano de 2006: para o Alcino, meu particular amigo e cúmplice em demandas particulares de espiritualidade; para o João Grego Esteves, a quem venero como uma das minhas mais recentes e consistentes referências éticas e intelectuais e que faz o favor de me honrar com a sua amizade e de nos brindar (a todos) com a sua presença constante, na tertúlia maprilista.

Ainda um grande 2006: para o António Moreira e o Rogério Rodrigues que sabem da minha amizade, do meu respeito, da minha veneração e da minha admiração por eles. Sem eles (porventura não o saberão em toda sua extensão...) não seria o que vou tentando ser: mais sábio, mais tolerante e mais humilde.

Para os restantes bloguistas, também, um grande ano de 2006.

José Albergaria

segunda-feira, janeiro 02, 2006

Virem o disco!

Intervenho por primeira e última vez vez no alado debate que vem mobilizando o nosso desprevenido blogue. Alado lhe chamo não no sentido das "palavras providas de asas" que Homero tanto prezava (talvez porque também já nesse tempo houvesse animais a falar e a escrever) mas antes porque as armas de arremesso têm sido dois bichos com tais apêndices reais ou metafóricos, a águia e o dragão, além da voadora ponta de lança de um Jorge .Da águia, prosperam por aí exemplares magníficos,designadamente aquele que está a tornar-se "cliente" regular dos principais programas desportivos europeus graças ao espectacular desempenho antes dos jogos do Benfica.Do "dragão", o melhor que se conhece é um repelente largarto indonésio de mortal peçonha concentrada na baba. Ao terceiro figurão (perdão,figurante),sugiro que o procurem para as gélidas bandas das Flandres,onde recentemente terá dado à Costa,por efeitos da COgestão que se instituiu em frutaria das Antas também estabelecida no ramo dos doces e cafés. Mas,regressando à vitela tépida, entro hoje na conversa para pedir aos amigos intervenientes que virem o disco e voltem a melhor música, que aliás tão bem executam. Ainda assim, deixarei, a título de contributo final, uma reflexão: altaneira como a da ave ou rasteira como a do réptil, a ironia é sempre mais eficaz quando arguta...e mais divertida quando consegue que a levem a sério.

Como sempre, JGEsteves

De moi pour moi

Meu caro amigo Albergaria, falo-te de moi pour moi, que é como quem diz de mim para ti, numa versão mais intimista. Não que tenha a veleidade de te conhecer no teu mais profundo ser. Mas conheço-te um pouco, para saber quem és, o que queres e o entendimento que tens do mundo.O que sei ser recíproco. Por isso, podemos disutir, de um modo fraterno e tolerante, recorrendo à ironia e à provocação, sem ofendermos o outro e, por via disso, a nós mesmos.
Se algum mérito, teve este debate em torno do futebol, do dragão e da águia, foi o de ter animado um blog, que parecia ter caído no limbo. Sob este aspecto, sinto-me satisfeito, por ter respondido à tua provocação (lembras-te?). Pena é, que seja o futebol e não outro assunto mais sério o responsável por esta reanimação, cujos resultados ainda desconhecemos.
Gostei da tua prosa, revendo-me certamente nela. Dois reparos:
1. nem todos os benfiquistas são tolerantes, como não o são todos os portistas ou sportinguistas.
A tolerância é própria de homens como tu, eu ou os nossos maprilistas, que partilham connosco as ideias.
2. ´Nem sempre Péricles se mostrou indiferente aos insultos. Pelo menos, por duas vezes reagiu bruscamente:
a) quando Creonte ofendeu a sua dignidade, acusando-o de querer ascender ao poder em seu proveito;
b) quando, por amor a Helena, agrediu um jovem efebo, que se atravessou no seu caminho. Como homem íntegro que era, de acordo com o seu biógrafo Plutarco, arrependeu-se do seu acto, pedindo depois desculpa ao jovem ateniense.
Esgotado o tema das aves, debrucemo-nos, então, sobre outros desafios mais importantes, tentando evitar derrotas, que, a acontecer, serão certamente derrotas de todos nós
Sem mais nada, despeço-me com um abraço fraterno
Alcino

PS. Nem sempre estão certas as interpretações que outros fazem acerca das nossas suposições.

Je - est un autre

Esta possibilidade humana que temos de nos olhar de fora de nós mesmos, traduzida nesta imorredoura, quanto francesa, fórmula - remete-nos para aqueloutra - helena: "conhece-te a ti mesmo".

Tudo isto vem a propósito da prosa expendida em torno da mitologia avicola feita clube de futebol.

A palestra, a disputa, a réplica e, raras vezes, a tréplica podem ser exercícios de mui grande elevação: estilistica, de saber, de ironia, de humor e de elegância.

Nós, os cultores da águia bicéfala, cumpre-nos o exercicio da tolerância, que deve ser a primeira das qualidade - sobrepondo-se a todos os humanos defeitos figurando, por tal, como a primeira das qualidades.

O "desportivismo" é apanágio do gentleman que, tal como o enorme estadista ateniense Péricles - nunca parava sequer para responder a insulto, remoque ou chiste com que pretendessem atingi-lo.

O exercicio da conversa, mesmo enformada por disputa clubistica, não deve nunca, em meu modesto parecer, ultrapassar os limites a que a sã amizade maprilista nos obriga e consente.

Sendo responsável pelo pontapé de saída desta novela, dedilhada já a oito mãos - com a alegoria da águia e do éter, quero sublinhar tão sómente que na lenda da luta de S. Jorge (ou em versão recente: Jorge o vitorioso) contra o dragão ( nas duas versões que conheço) acontecem sempre coisas terríveis para os préclaros simbolos do FCP: morrem ambos.

Curiosamente, na Peninsula Ibérica o dragão é femea, daí o nome Coca. Na variante generalizada, S. Jorge, em defesa duma jovem princesa, mata o dragão, mas, contrariamente à outra lenda ( a de Santa Marta - em que esta domina o dragão e o passeia depois pela trela) não domina o Dragão, ou Coca, na nossa versão iberista e femeeira.

Contudo, em Monção, a tradição da luta de S. Jorge com o dragão, repetida ano após ano, intercala a morte do Dragão/Coca com a morte de S. Jorge: umas vezes morre este...e noutras aquela.

Entre uma e outra versão, como diria um amigo portista, venha o diabo e escolha (não confundir com os diabos vermelhos).

Como se deprenderá - este meu post não pretende mais que dar um modesto contributo para aclarar o uso da simbologia avicola aplicada à disputa futebolístico/clubística.

E por aqui me fico, com o desejo que 2006 seja o ano de todas as derrotas, a começar, obviamente, por aquela que interessa ao POVO de Esquerda: a de Cavaco Silva nas eleições Presidenciais em 22 de Janeiro.

Um enorme abraço,

José Albergaria

PS - As vezes, os anónimos não são quem pensamos ou desejamos que fossem...

Gil Vicente, o super dragão, o anónimo (que afinal roubou a prosa ao outro) e o eu (que não sou eu, mas um outro)

Curiosa a novela a respeito de águias, dragões e S.Jorge, que motivou um post de um anónimo, arvorado em discípulo de Gil Vicente e um comentário de um Eu (não tão atento como isso), mas suficientemente deselegante no modo como se dirige a um clube do Norte (suponho eu ao FCP).
Comecemos pelo anónimo, que afinal coloca na sua boca as palavras do outro. O trecho até nem está mal escrito e não deixa de ter alguma piada. Pena é que subverta o espírito vicentino, que se caracterizou pela amoralidade e a crítica às aparências. Se o texto do anónimo (que afinal não é dele, mas de outro alguém a quem o roubou), alguma característica revela não é o amoralismo vicentino, mas mais o moralismo beático e seráfico próprio de quem foi motivo de chiste e crítica de metre Gil. O anjo que acolhe o super-dragão está longe de parecer o guardião do paraíso descrito no Auto da Barca do Inferno, confundindo-se isso sim, com o frade gordinho e papudo, que acaba penando seus pecados. Depois, convenhamos ser-se tão moralista e acabar confessando o roubo de um texto, não parece coerente. A não ser que o anónimo pense que ladrão que ofende dragão tem 100 anos de perdão.
Quanto ao comentador, o seu post merece alguns reparos:
Primeiro, as relações entre dragões e águias não são exclusivas do tempo em que os animais falavam. Não só porque, ainda hoje, os animais continuam a falar e a escrever, como essas relações ainda há poucos anos existiam, só que não tendo por alvo S. Jorge, mas o leão, a fazer fé nas palavras proferidas então por Dias da Cunha.
Segundo, não deixa de ser curioso o modo depreciativo como o Eu se refere aos clubes de bairro, sobretudo, tendo em conta que é adepto de um clube, que, na sua génese, foi uma agremiação de freguesia (de Santa Maria de Belém), a qual, segundo o meu bom amigo Alves da Silva (ilustre cultor da história da Amadora), se inseria administrativamente, não em Lisboa, mas na rcunscrição amadorense. Quanto à dimensão nacional do Benfica seria bom recordar o discurso de Elmano Alves, líder da ANP, em Fevereiro de 1965, em reunião da comissão central deste organismo, em que afirmava "ser o Benfica uma das imagens de marca do Estado e da Nação Portuguesa".
Terceiro, numa coisa tem razão o atentamente eu: matemos de vez o animal. Náo necessariamente o dragão, o qual, de resto, não teria, segundo algumas versões da lenda, sido morto, mas ferido e levado como troféu, mas a águia. talvez assim possamos viver anos de prosperidade, como acreditavam as tribos sioux.
Sem ofensa e muito fraternalmente para voces meus caros Anónimo e Eu
do V. maprilista
Alcino Pedrosa

PS. Cá por mim a prosa esgota-se por aqui

BOM 2006

domingo, janeiro 01, 2006

Ano Novo

O pânico do guarda-redes na altura do penalty terá alguma comparação com o pânico do jornalista que, em frente do teclado, procura dar corpo aquela notícia que todos esperam que ele trate ?

Talvez sim, talvez não! Sobre este último pânico os meus ilustres colegas de blog terão, certamente, não só muitas e boas teorias, mas fundamentalmente, inesquecíveis vivências.

Procurando inverter o ónus da prova, e dado que ambas a situações são muito mais preocupantes respectivamente para o marcador da grande penalidade e para o jornalista que se confronta com a ausência de acontecimentos para tornar em notícias, registo neste início de semana, mês e ano um desejo de levar de vencida a luta que diariamente vou travando entre tudo o que deveria fazer e o pouco que vou fazendo.

Espero que a salvação do mundo não dependa exclusivamente dos desideratos a que pretendo dar corpo mas desejo muito que as minhas pequenas realizações do dia-a-dia que permitem à terra manter-se a rodar em torno do seu eixo tenham lá um pouco da minha essência.

Com tudo isto, e com a falta de resposta para a forma de encarar a marcação do penalty, espero que este ano seja um potencial candidato ao vencedor dos melhores 12 meses das V. vidas. Se eu poder contribuir para facilitar essa votação ficarei muito satisfeito.NT, patrocinador oficial de 2006