segunda-feira, dezembro 26, 2005

Uma cultura da desconfiança

A campanha eleitoral para a presidência da República tem revelado, entre os eleitores, a existência de uma atitude de desconfiança relativamente aos políticos, que, apesar de constituir um lugar-comum nos regimes democráticos, não deixa de ser preocupante.
Primeiro, porque estamos perante uma situação, que objectivamente, queiramos ou não, pelo absentismo que a caracteriza, acaba por ferir o exercício do poder político na sua fonte de legitimidade democrática (as eleições);
Segundo, porque esta cultura de desconfiança proporciona o aparecimento de um tipo de políticos, que, ostentando uma auréola de supra-partidarismo e de defensores dos interesses nacionais, se assumem como a única alternativa viável às estruturas partidárias tradicionais, deixando, assim, os destinos do país entregues a figuras providenciais.
Terceiro, consequência do anterior, porque vem acentuar a crise da democracia representativa. Corre-se o perigo de, a curto prazo, se verificar uma redução de democraticidade do poder, tornando-o exclusivo de uma minoria activa, que, se agora se substitui no seu exercício pelo mecanismo da rotatividade, posteriormente o poderá fazer pelos mecanismos institucionais (mais do que constitucionais) e legislativos existentes;
Quarto, porque vem perverter o princípio do exercício do poder, em democracia, ao afirmar o primado do indivíduo sobre o finalidade social da sua acção, abrindo assim o caminho a «quem manda» e não a «quem faz bem».
De posse destes elementos, talvez possamos compreender melhor porque esta cultura da desconfiança interessa a certos candidatos
Alcino Pedrosa

1 Comments:

At 27 dezembro, 2005 19:31, Blogger Aqueduto Livre said...

-- ¡ Qué tristeza tener que morir por causa de mis propias plumas !
Más profundo es nuestro dolor cuando nos vencen con nuestras propias armas

Nem de propósito!
Será que a desconfiança na representação política não se deve muito a muitos dos próprios representantes?
Esta é uma velha questão respondida conforme o momento eleitoral que se vive e espelhada numa frase extraordinária constantemmente repetida: «É necessáro abrir o partido à sociedade». Quer isto dizer que nem sempre a sociedade pode participar no partido. Só quando surgem as tais ocasiões ou questões levantadas no artigo em comentário.
Se eu fosse "a sociedade" começava por perguntar se a entrada no partido é só reservada a casais?
Nesse caso, convidava uma aderente e logo passavamos a ser mais dois participantes.E se ela tivesse uma amiga ou prima civicamente disponivel e interessada passávamos a ser mais 3 ou 4.
E se a turma dela gostasse destas coisas tinhamos uma lufafa de ar fresco. Nesta última situação convinha convidar uns amigos para que a representação democrática não se tornasse muito cansativa.
E assim a brincar às entradas e às amigas talvez encontrassemos mais gente disposta a fazer-se representar e a ser representante deixando que tal tarefa não se destinasse aos tais iluminados que só sairam da "sociedade" para ir fazer a rodagem ao carro novo.

O dragão de S. Jorge também não morreu atravessado por uma seta?
NT

 

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